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Arautos do Estendal

Ela, do alto das suas esbeltas e intrigantes pernas, veio caminhando quintal abaixo até ao estendal, dependurando a toalha onde, minutos antes, tinha limpo as últimas gotas de água. O Arauto viu, porque o Arauto estava lá. E tocou a trombeta.

Ela, do alto das suas esbeltas e intrigantes pernas, veio caminhando quintal abaixo até ao estendal, dependurando a toalha onde, minutos antes, tinha limpo as últimas gotas de água. O Arauto viu, porque o Arauto estava lá. E tocou a trombeta.

Arautos do Estendal

20
Set12

Mulherio abundante – parte 1

pickwick

A minha vida profissional já não é o que era. Subitamente, vejo-me catapultado para uma situação em que trabalho semanalmente em cinco edifícios diferentes, distantes alguns quilómetros uns dos outros, sendo que há uma abundância relativa de mulheres. Relativa, porque, embora estando em maioria, são pouquinhas. Faz parte da desertificação do interior, portanto.

 

À segunda-feira, é com a Cricri, que já conhecia de anos anteriores. Nada a relatar, que, sendo casada, não é de se deitar fora.

 

À terça-feira, não conta, é dia de mangueira.

 

Quarta-feira, foi a Fáfá, casada, simpática, mas potencial candidata a uma lipoaspiração em larga escala. Só que, a Fáfá fez logo o favor de me ir apresentar a uma colega de trabalho que é loira, tem olhos azuis, é jeitosa, só deve ter uns 50 anos, e desmancha-se em cerimónias do alto daqueles tamancos finórios. Aproveitou logo para me ir mostrar o computador, na esperança de eu lhe meter aquilo a trabalhar, coisa que não consegui, dado ainda não ter capacidade para reparar placas gráficas só com o olhar. A Fáfá bem que disse o nome dela, mas, lá está, quando me apresentam alguém, é escusado dizerem-me o nome, que passa-me tudo ao lado. Pior ainda, se o cabelo for loiro, pois fere a vista e o cérebro empana por uns segundos. Na próxima semana, pode ser que haja oportunidade para descobrir o nome da jeitosa.

 

À quinta-feira, é com a Féfé. Outra casada, dizem que “é de gancho”, mas não tenho reclamações a fazer. E é agradável à vista, vá, tenho que reconhecer, o que é bom para estimular um ambiente de trabalho motivador de grande produtividade. Tal como a Fáfá, a Féfé também veio-me com uma conversa meio engasgada sobre o meu desempenho profissional, que dizem que eu coiso e tal e tal e tal... Não cheguei bem a perceber o “coiso e tal”, mas pareceu ligeiramente não negativo. A Fáfá ainda juntou um estranho “especial” quando tocou neste assunto. Vou ter que me chatear? Às tantas…

 

À sexta-feira, que por acaso é já amanhã, é com a… vá… com a Aldonza Lorenzo. Disse-me, quem sabe, meio em sussurro, que uiiii… essa é que… ufff… ufff… (só lhe faltou uivar). Até tenho medo! A moça, realmente, tem um porte tão imponente quanto elegante. Mas, também não era preciso exagerarem. Amanhã já tiro as dúvidas, caso consiga ficar a manhã toda ao pé dela e não tenha que sair à pressa para ir a casa mudar de roupa depois de me babar dois litros pela peitaça abaixo. pickwick

17
Jul12

Leggings para cima

pickwick

Depois de ter aprendido com a Liliana o que são umas leggings, um gajo sente-se logo à vontade para divagar sobre esse adereço modernaço.
Assim que dei os primeiros dez passos dentro do Pingo Doce, esbarrei-me visualmente com uma jovem funcionária de rabo alçado a ajeitar uma pilha de cestos. Era loira e usava leggings.


Ainda eu estava com o cérebro a processar a informação (toma nota, são leggings, são pretas, é loira, são pretas, leggings, ui, pretas, loira, coiso), quando a moça abandona a pilha de cestos a puxar as leggings para cima.


Eu não sabia que as leggings se puxavam para cima. Quem as puxa para cima, é porque, em primeiro lugar, elas deslizaram para baixo. Eu não sabia disso. Liliana, não me ensinaste a coisa toda! Assim, um gajo é apanhado de surpresa, como quem aprende uma receita nova para um bolo, mas não sabe que tem que acender o forno.


Dado o traçado muito positivo da anatomia da moça, perfeitamente visível em meia dúzia de movimentos de antílope, fiquei intrigado. Será que comprou as leggings antes de começar uma dieta rigorosa e agora aquilo escorrega-lhe por entre as nádegas qual faca na manteiga? Será que as nádegas são tão gelatinosas que qualquer movimento reformata o conjunto traseiro a tal ponto que as leggings perdem o norte e caem por si? Será que o material é pouco elástico e o fecho metálico no tornozelo prende de tal forma as leggings às canelas que a cintura descai assim que a moça se dobra para a frente? (sim, reparei no fecho metálico no tornozelo) Será que simplesmente eram umas leggings novas e o gesto resultou de uma preocupação instintiva com o correcto posicionamento do material em relação ao corpo? Não sei, não sei… Mas este desconhecimento atormenta-me a alma… pickwick

 

Actualização - Comentário científico da Liliana: claro que as leggings se puxam para cima, ora essa!, mas normalmente isso acontece quando o número não é o ideal ou se está há muitas horas com elas e com o suor e afins elas deslizam.

21
Mai12

Falha de pontaria

pickwick

Depois de três horas de viagem, desde a capital, chegámos finalmente a Coimbra. Parecia estarem em curso as celebrações de um qualquer mega-casamento, tantos eram os carros que apitavam à nossa volta. Um deles atravessou à nossa frente, com três jovens alojados na bagageira aberta, de pernas penduradas no para-choques e segurando copos e garrafas. Provavelmente, não seria um casamento, mas um festejo futebolístico. 

 

Fui levar o meu companheiro de viagem até onde havia deixado o seu carro, numa ruela manhosa algures na zona antiga da cidade. Durante alguns minutos, fizemos a trasfega do material dele para o respectivo bólide. Mochilas e caixinhas, basicamente.

 

Entretanto, enquanto o Miguel ultimava a arrumação perfeccionista na bagageira, dei conta de uma moça ao longe. Loira e elegante, trajada com roupas de cores vistosas, entre o preto e o vermelho, acabava de fechar a porta do seu carro e metia-se a caminho, rua acima, na nossa direcção. Passo lento, como quem não tem pressa, em cima de um par de saltos altos - o calçado perfeito para uma rua com chão de “paralelos”.

 

O Miguel bateu com a porta da bagageira e eu fui ter com ele, com o meu ar de gajo chateado com a sorte: oh pá, já fechaste isso? que pressa! devias demorar mais tempo, para apreciarmos a gaja que aí vem… Fiz de conta que encetava o discurso de despedida, para ver se ela passava por nós. Pelo canto do olho, topei que já estava a poucos metros. Ui! Ui!

 

Nisto, ouço o Miguel: então? andas a passear?

 

Pensei logo: ah e tal, querem ver que a gaja é uma galdéria e o Miguel anda aí na má vida para a conhecer? Olhei-a de frente, enquanto eles trocavam beijinhos e faziam conversa de circunstância. Afinal, era moça para a minha idade, ou pouco mais velha. Mas fazia cá um vistaço! Uiiii!... Muito bem apresentada, realmente. No entanto, a combinação de elegância, roupa e cor de cabelo, fazia-me imaginar rapidamente uma mulher para todo o serviço.

 

Em menos de cinco segundos, o Miguel estava a apresentar-me a moça, beijinho-beijinho, nome para lá, nome para cá, ah e tal esta é a mulher do Fernando. Claro que é, pensei eu, mas que grande argolada! O Fernando é um amigo comum e excelente pessoa. Fiz meia dúzia de palavras de circunstância e meti-me a olhar para as fachadas das casas antigas à volta, na esperança de que a moça jamais percebesse que poucos segundos antes estava rotulada de rameira. Nunca se deve menosprezar a capacidade feminina para adivinhar, apenas com uma simples troca de olhares, o que vai na cabeça de um homem…

 

Pouco depois, despediu-se e foi embora, aguentando-se habilmente por cima dos “paralelos”, qual penico equilibrista. Não troquei palavra alguma com o Miguel sobre o assunto. Fiquei tão engasgado que não me ocorreu mesmo nadinha. Só dei Graças por não ter tido uma inoportuna descaída ao género da construção civil: nem assobios, nem caça aos macacos, nem meio-fósforo entalado nos caninos, nem um piropo de vocabulário refinado. Teria sido um incidente diplomático sem reparo possível. pickwick

06
Abr12

Piropos em brasileiro

pickwick

As redes sociais têm destas coisas:


“vemmmmmmmmm
amor
vamos fazer amor
vc quer
vc deve ser lindo nu
quero ve vc nu
amor
amo vc
queria fazer amor com vc”

 

Um gajo está perfeitamente descansado, quando leva com uma mensagem destas pela proa. A autora tem quase cinquenta anos e pode ser que tenha sido uma rapariga engraçada, há uns trinta e cinco anos atrás, sei lá. Loira, ainda por cima.

 

Apesar da intensidade da mensagem, acho que a versão lusitana desta seria muito ordinária. Porque, a bem dizer, esta mensagem nem é ordinária. Não fala em coito, nem em coisas que se fazem na ou com a boca, nem em orifícios, nem em líquidos, nem em coisas que podem ser apertadas com as mãos ou os dentes. Antes, fala na beleza da nudez e na pureza do amor. É lindo, tenho que reconhecer. A versão lusitana seria, certamente, enriquecida com um mui rico vocabulário na onda “massa-para-assentar-tijolos”. As brasileiras parecem ter uma visão amorosa do próprio amor. Isto é, um amor que é mais do que simples amor: é um amor amoroso. Sei lá.

 

Não querendo generalizar, em geral as brasileiras aparentam ter uma auto-estima inabalável e do tamanho do universo. É um facto que sempre me impressionou. Ah e tal, “fogosa e linda de morrer” (credo! parece uma porca atropelada por um carrinho de rolamentos conduzido por um rinoceronte). Ah e tal, “deusa do amor” (só se for no meio dos chimpanzés!). Ah e tal, “rose original” (pudera! quem é que te quereria copiar?). Ah e tal, “loira e deliciosa” (para dar de almoço aos leões? também acho que sim…). Não as consigo perceber. Não vendem espelhos daquele lado do oceano? Lá para aquelas bandas não parece haver complexos do que quer que seja. São todas boazonas, irresistíveis, lindas e poderosas. Não há mulheres feias, mal feitas ou com aspecto de saco de batatas greladas. É um mundo! pickwick

26
Mar12

A malta sem dois dedos de testa

pickwick

Nunca se sabe quando é feita uma nova descoberta. Aliás, a imprevisibilidade é como que um apêndice de qualquer descoberta. É isso que adoça o desafio de descobrir novos mundos, novos conceitos, nova gente.

 

Outro dia, conheci uma moça da minha idade. Elegante, simpática, a transbordar fofura. Que interessante, pensei eu. Conversa puxa conversa, e a seguir à leitura dos livros veio a escrita dos mesmos. Neste alinhamento de conversa, achei por bem partilhar a existência deste blogue, cuja leitura agrada a um núcleo muito restrito de portugueses. Partilha arriscada, eu sei, eu sei…
 
A reacção da moça foi muito franca, por isso louvável:
“Sem comentários… É com estes textos que pretendes editar um livro? Este tipo de literatura não interessa a ninguém com dois dedos de testa, mas como a maioria não os tem, vais vender milhares… tens imensos exemplos em Portugal…”

 

E nunca mais falou comigo.

 

Portanto, existe, nestes comentários, um insulto discreto aos leitores deste blogue, e outro, mais generalizado, ao povo lusitano, que já conquistou meio mundo mas que, nos tempos que correm, prefere ser conquistado e levar uns apalpões no rabo enquanto lhe metem a mão no bolso. Por outro lado, há um claro incentivo pessoal, muito esperançado, à publicação dos textos deste blogue como literatura para gente menos prendada pela Natureza.

 

Se eu escrevesse alguma coisa de jeito, estava condenado ao fracasso editorial. Escrevendo disparates, para gente sem dois dedos de testa – a maioria do povo, o sucesso é quase garantido. Gosto desta abordagem, de facto.

 

Tenho pena que a moça tenha deixado de falar comigo. O verão aproxima-se e eu estava cheio de curiosidade anatómica. Havia, ali, muita qualidade estética. Cabelos longos e escuros. Uma projecção de elegância a curto prazo, assim que ela perdesse os 10 quilinhos que tinha adquirido inadvertidamente. Até estávamos a combinar eu levar-lhe daqui um queijinho da serra, para a ajudar a perder os quilinhos a mais. Depois, só o céu seria o limite.

 

Mas, convenhamos, mesmo sem o blogue, em pouco tempo deixaríamos de ter assunto de conversa, mal ela descobrisse o meu défice intelectual a partir de uma qualquer piadinha sem jeito ou uma abordagem menos convencional ao dia-a-dia. A vida tem destas coisas, destas dificuldades, destes obstáculos.

 

O meu futuro, contudo, é que começa a desenhar-se com alguma nitidez. Será, eventualmente, num relacionamento sério (tipo Facebook) com uma moça sem dois dedos de testa, que faça parte daquela maioria dos portugueses que não têm dois dedos de testa. Ou seja, tendo por base um determinado mito urbano e a teoria das probabilidades, corro sérios riscos de ver subitamente concretizado o meu sonho de namoriscar uma loira! Nada mau! pickwick

04
Jul08

A deusa lenhadora

pickwick

Um dia destes, uma colega de trabalho convidou-me para ir espreitar o princípio da casa dos seus sonhos, num terreno em área pouco urbana, mesmo no sopé da Serra da Estrela. A localização específica do terreno que ela comprou, é que não correu assim muito bem. Durante alguns quilómetros, a paisagem era fantástica: a soberba encosta da serra, mesmo de frente, tão próxima. Ao chegar ao terreno dela, um vale, desaparece a serra de vista, enfim, fica o ar serrano, a proximidade, o ambiente. Não se pode ter tudo, mas não era eu que ia comprar um terreno a poucas centenas de metros de uma serra, e não ter vista para a serra. Pormenores técnicos, portanto.

 
A casa veio do estrangeiro, lá do norte, e é totalmente em madeira, à excepção da sapata de cimento para servir de base. A madeira, XPTO, veio lá bem do norte, tipo Rússia, toda tratada com técnicas especiais de corrida, cortada, entalhada, etiquetada, pronta a montar. Tipo puzzle. São algumas dezenas de toneladas de madeira, entre outro material. Isto é uma cena muito à frente: o projecto arquitectónico é feito por cá, mas depois o material é todo preparado lá bem longe. Depois vem tudo em camiões, incluindo trabalhadores, e planta-se tudo no terreno durante uns dois meses, até a coisa estar concluída.
 
Eu também queria uma casa assim, embora tenha ficado com algumas reticências quanto à espessura da madeira. Consta que é mais saudável, mais quente de Inverno e mais fresca de Verão, tem melhor isolamento, menos humidade, etc. Eu acho que até tem algum estilo, tirando a ansiedade diária de regressarmos a casa sem sabermos se a coisa ainda está de pé ou se já foi transformada num monte de cinzas e carvão.
 
Quando cheguei ao terreno, a equipa de montagem encontrava-se a relaxar do calor brutal que se fazia sentir nesse dia, sentados debaixo de uma sombra, dando dois dedos de conversa. A minha colega apresentou-me a um casal de holandeses, que seriam os responsáveis pela obra. Apresentou-me como um potencial interessado no produto, num futuro qualquer.
 
E é aqui que entra o principal assunto deste post, uma vez que o que está para trás é mera palha. Falo da holandesa, claro! Falo de uma loira natural, olhinho azul, metro e sessenta, corpo incrivelmente elegante. E quando eu falo em corpo elegante, em especial quando é incrível, falo de um corpo elegante, obviamente, sem gorduras, com maminhas tipo concha-da-sopa, calças de ganga justas nas nádegas, trintas e poucos, rosto bronzeado pelo contacto diário com o sol, camisolinha de alças, etc. Enfim, um mimo da natureza para com a Humanidade.
 
Mas, mais incrível ainda, é o facto de esta mulher trabalhar, lado a lado com os homens, no transporte de madeira! Tipo deusa lenhadora, ou sei lá. Deve ser por isso que tem aquele corpo incrível. Imagino-a numa forma física tipo atleta de alta competição, gordura zero, fibra por todo o corpo, ah e tal. Uma coisa fora do normal! Sim, senhora! E vivam as casas de madeira! pickwick
12
Set07

Chouriças, lágrimas, tartes, baba e ranhetas

pickwick
Mas que raio de dia, este. Até não começou muito mal, com os colegas de trabalho a comparecerem em peso, uns mais cedo que outros, os primeiros para trabalhar, os segundos para a reunião geral. A curiosidade pela distribuição de serviço e os horários de trabalho, as saudades, enfim, parecia um formigueiro. Pessoalmente, afligem-me estas situações pois, para além de ser alérgico a gatos e gatas, também tenho uma alergia crónica a ajuntamentos de pessoas. Mesmo que sejam todas conhecidas. É mais forte que eu. Não sei explicar. Mas, pronto, a profissão assim o exige e mais não há que fazer senão encaixar a situação. Da parte da tarde, assim que acabou a reunião geral, juntaram-se os três grupos de profissionais desta instituição, somando para cima de setenta pessoas. Juntaram-se, porque é bonito juntarem-se, especialmente se for na cantina, com meia dúzia de mesas exageradamente repletas de iguarias, petiscos, doces e bebidas. Uma concentração de comida suficiente para alimentar – à vontade – umas quatrocentas pessoas. Um momento de convívio gastronómico, para começar o ano depois das férias. Um completo exagero. Deve ser mania do povo aqui das beiras, que, quando toca ao rancho, não se atrevem a deixar espaço vazio na mesa. Não é que me esteja a queixar. Fiz um bocado de cerimónia porque, como já referi, tenho alergia a ajuntamentos de pessoas, seja à mesa, ou numa festa do pijama molhado. Fiz um bocado de cerimónia, mas, ainda assim, deu para provar algumas coisas saudáveis, como chouriças, bolas de carne, pasteis, tinto, bolinhos, tartes, presunto, Sumol, enfim, coisas assim. Comedidamente. Isto é, com discrição, comendo apenas duas fatias da bola de carne, em vez de devorar a bola toda, comendo apenas uma elegante fatia de tarte, em vez de repetir sete vezes, comendo apenas uma fatia de presunto, em vez de esvaziar o prato, e por aí fora. Estes momentos de confraternização mexem-me com os nervos. Andar ali a vadiar de uma ponta para a outra da mesa, metade das pessoas a fazerem também cerimónia, a olharem umas para as outras. Ora converso de pé, ora converso sentado, ora fico só e abandonado de pé, ora fico só e abandonado sentado, ora controlo os trajes femininos da ocasião, ora aproveito para verificar as medidas da D. Susana – que, pela primeira vez, vislumbrei à civil, sem a “farda” de trabalho. Não gosto destas cenas. Parecem aqueles cocktails do jet-set, pirosos, autênticas percas de tempo. Para comer, com prazer, é com os amigos, não com os colegas de trabalho. Mas, enfim, ossos do ofício. Entretanto, aproveita-se a ocasião para, de uma forma suave, passar a mão no pêlo às fãs do ex-patrão, encetando diálogos presunçosamente agradáveis e debates amigáveis, na tentativa de fazer confluir opiniões e sentimentos. No meio disto tudo, soma-se o desespero de algumas colegas, a chorarem baba e ranhetas por causa do horário de trabalho que lhes coube, nomeadamente por causa de umas insignificâncias que, no feminino, assumem proporções catastróficas, dignas de uma bíblia ou de um filme tipo “Jurassic Park”. Andam pelos cantos, lacrimejam, ficam com ranhetas penduradas das narinas, fungam, suspiram, fogem e simulam uma infelicidade maior do que se tivessem sido violadas a seco e com areia por um gorila-da-montanha muito macho mas muito bruto. O patrão Zé, coitado, perdeu logo o apetite com a estória das colegas choramingas. Coitado, e logo ele, que tem perdido noites a tentar que as meninas ficassem com um horário porreiro e aceitável. Não é justo. Mas, com gajas, já se sabe, a justiça não tem corpo, não tem alma e não passa de uma nuvem lá ao longe. Apeteceu-me pegar-lhes pela nuca e enfiar-lhes as fronhas na travessa das rodelas de chouriça assada, ou no prato da tarte de maçã, ou, então, pegar-lhes pelo elástico das cuecas e catapultá-las janela fora. Também tenho alergia a gajas a chorar. Não se aguenta. Não há necessidade. E não há paciência. Ainda por cima, volta e meia ando eu aqui a elogiá-las, ah e tal, ui ui, e não sei quê. Hoje, só me apetecia varrê-las para debaixo do tractor do estrume e passar-lhes com as rodas por cima. Sacanas! Gajas! Ai, que nervos! Por falar em gajas, quero terminar com uma singela referência ao facto de a loira dentuça ter sido a grande dinamizadora dos enchidos neste convívio gastronómico, organizando a assadura de dezenas de chouriças de carne, chouriças de sangue e alheiras, que sobraram em quantidades absurdas, mas que, mesmo às rodelas, não escondem a sua forma original: a de óbvios símbolos fálicos e potenciais apaziguadores de ansiedades primitivas. Além de muitos carros e pouca roupa, a loira dentuça também gosta de se ver rodeada de muitas chouriças. Não lhe fica nada bem, com aquela idade e aqueles dentes. pickwick
12
Abr07

Chouriça de azeite

pickwick

Hoje de manhã cruzei-me com a Mary. Ah e tal, logo depois da reunião aparece lá em casa para assarmos umas chouriças que têm que se comer rápido, disse ela. Ah e tal, está bem, disse-lhe eu. O Philip e o Claude também iam, bem como a Charlie, que vive com a Mary. Depois da reunião, ainda fiquei à espera do Philip e do Claude, o primeiro porque estava a ver os mails e a assistir umas amigas no MSN, o segundo porque não sei bem, mas estava com uma gaja qualquer. Enquanto esperava pacientemente, apareceu na sala uma loira. A sério! Loira e gira! Normalmente as loiras portuguesas são mais feias que um escaravelho caído no óleo queimado de fritar batatas, mas aquela era bem gira. O Philip, que é jovem e pouco dado a contenções, começou logo a querer ficar mais tempo para tentar ir à mesma reunião que a loira, comentando esta pretensão com alguma sonoridade. Entretanto, entrou o patrão na sala. Ah e tal, venha ali para o gabinete, disse ele para a loira. Pronto, sacana do patrão! Lá foi a loira e voltou a sala à mesma pacatez e pobreza artística. O Philip queria ser patrão. Eu, hoje, também queria ser aquele patrão, para levar uma loira jeitosa para o gabinete. Ui, ui! Bem, em casa da Mary e da Charlie, a mesa estava ligeiramente mais bem recheada. Até havia gelado de rum com passas, tal como sugeri da outra vez! Nas brasas de uma lareira, duas chouriças de azeite (ou em azeite, ou sei lá o quê) chamuscavam-se. Uma porcaria! Enjoativo até mais não. É como comer uma chouriça normal e beber meio litro de azeite para acompanhar. Felizmente, havia uma terceira chouriça, dita normal, que soube muito bem a chouriça e melhorou o ambiente. Ah e tal, são caseiras, dizia a Mary. Pois sim, que sejam! A Mary é uma gaja esquisita. Tanta comida, tanta variedade, pão, folar, chouriças, cervejas, sumos, gelados, regueifa, etc., e ela, ah e tal, não gosto de nada do que está na mesa. Mas isto compreende-se? O Claude, que é um gajo simpático, perguntou-lhe logo aos gritos: então, e de chouriça crua, já gostas? A Mary engasgou-se um bocado, risota para trás, risota para a frente, enfim. Nova intervenção do Claude, que, para além de ser um gajo simpático, também é um gajo casado: eh pá, o que eu mais gosto na Mary é o cu! É mesmo bom, redondinho, perfeito. Confirmação do Philip: pois é, o Claude todos os dias diz que o que é mesmo bom é o cu da Mary. Risos, ha ha ha, he he he, hi hi hi… Eu também queria dizer qualquer coisa, mas não cedi à tentação de perder a compostura e complementar as referências estéticas da Mary. Fui forte e resisti. Disfarcei e olhei para a televisão. Má escolha! A telenovela que estava a passar estava impregnada de gajas jovens, podres de boas, todas trajando biquinis minúsculos, com peitos volumetricamente abastados, ah e tal, e pronto. A Mary inclina-se para a frente, para a lareira, para virar a chouriça, o elástico da cueca fica à mostra, o Claude resmunga que ela passa a vida a fazer aquilo em público e que um gajo fica logo desconcentrado, e blá blá blá. Por falar em gajas, vai a conversa para a loira da dentuça e da pele ao léu. Vulgo “loira do Mercedes”, por conduzir um jipe da Mercedes. Gritos histéricos, deles e delas: eia, que tem umas banhas gigantes a saltarem-lhe entre o top e a cintura, anda com umas calças todas esfaqueadas à frente e atrás, é feia, e as gajas assim não deviam andar naqueles preparos. Subscrevo totalmente. Ainda não tinha era reparado que ela tinha assim tantas banhas… estarei a ficar pouco exigente e muito distraído? Ou eles e elas é que são exagerados? Urge esclarecer! Pelo caminho, um contributo para o enriquecimento da história e da cultura da humanidade: o Claude revela que a Marilyn Monroe costurava botões do lado de fora das copas do soutien para imitar mamilos proeminentes, provocadores e excitados, que espevitavam a imaginação dos homens de todo o mundo, os quais, aos milhares, ainda segundo o Claude, se masturbavam às custas desses botões. O Philip confirmou: sim, a mãe dela até era costureira. Claro. Para não fugir a temas femininos, tombou a conversa para a Doce (mais um nome de código, sim), nossa colega de trabalho. A Doce, de há uns meses para cá mudou radicalmente a sua fisionomia. Sendo desportista, sempre a conhecei na casa dos 40 mas com um corpo fabuloso, fibroso e elegante. Dia após dia, vinha com umas calças justíssimas, espevitando a imaginação de quantos tropeçassem com o olhar na sua figura, de costas, encostada ao balcão do bar, a pedir uma tosta e um galão. Às vezes, justas demais. De há uns meses para cá, começou a engordar desalmadamente. O rosto permanece igual. Ou seja, a Doce está quase com corpo de baleia, mantendo o rosto de um modelo de passerelle. Passa pela cabeça de qualquer um que ela esteja grávida. Passou pela minha. E pela do Philip. Só que o Philip é assim mais dado a intimidades, daí que a apanhou um dia e perguntou, bem alto e em bom som, ah e tal, então, estás a engordar tanto… estás a ficar grávida, não estás? Não, não, responde ela, com um sorriso amarelo. Envergonhada, a Doce lá explicou que parou de tomar dezenas de anti-depressivos e outras porcarias do mesmo calibre, o que lhe provocou um apetite voraz, pelo que tem engordado a olhos vistos. Minutos depois alguém explicou ao Philip que a Doce já se tentou suicidar, embora tenha uma vida folgadíssima, casada com um médico, com uma filhota toda fofinha, vida profissional estável, etc. Apeteceu-me pedir à Mary para que, caso tome anti-depressivos, nunca deixe de os tomar. Mas fiquei melhor caladinho, guardando pensamentos badalhocos só para os meus botões. Acabadas as chouriças, acabadas as casacas onde cortar, viemos embora. Tenho que me cuidar. A exposição a estes ambientes e a estas conversas, não contribui, de forma alguma, para imprimir alguma decência no meu pensamento. Antes pelo contrário! Cus redondos, loiras boas raptadas para gabinetes, loiras dentuças com banhas de fora, gajas a engordar, gajas com botões do lado de fora do soutien, gajas das telenovelas brasileiras, e chouriças de azeite, não me trazem tranquilidade nenhuma! pickwick 

29
Mar07

A loira, a dentuça e a pele ao léu

pickwick

Outro dia, que era um belo dia de sol e calor, embora estivesse à sombra, fui acordado com violência. Era a hora do almoço, já mais para o começo da sesta do que para os aperitivos. Os meus dedos fervilhavam em cima de um teclado, olhos colados no ecrã onde as palavras surgiam a um ritmo alucinante, na ganância de aproveitar o tempo para adiantar trabalho e compensar o desleixo das semanas anteriores. Estava em transe-laboral, portanto. A sala estava resumidamente vazia, tirando a funcionária do bar, duas plantas de interior e o ruído da televisão. Estes momentos de sossego proporcionam oportunidades únicas para laborar com produtividade, sem gajas aos pulos, sem gajas a falar de parvoíces, e sem gajos a aturarem as gajas aos pulos e a falarem de parvoíces. A bem dizer, um gajo adormece para o trabalho – uma espécie de nível transcendental de ausência de sorna em que não há paragem nem apeadeiro. E foi deste estado de adormecimento que fui violentamente acordado. Do meu lado direito, a cerca de oito metros e trinta centímetros, surgiu um corpo ondulante, encimado por uma farta cabeleira loira. Ui!, exclamou imediatamente o meu subconsciente. Este alertou o consciente, o consciente alertou-me a mim, eu alertei o meu pescoço, o meu pescoço fez rodar a minha cabeça e zás. Olhos postos no corpo ondulante encimado por uma farta cabeleira loira. Não sei quem controlou os meus olhos naquele momento, mas o certo é que estes se fixaram alarvemente na zona do umbigo do corpo ondulante. Zona essa completamente ao léu! À mostra! Ali! Quinze centímetros de pele entre a cintura das calças e a borda inferior do top. A pele cor de bronze, como se tivesse mergulhado num banho para a tingir. Uiiiiiii!, exclamei, entre dentes. Corpo elegante, a abanar-se com o andar, nádegas e pernas sob uma calça de ganga deslavada e justa, apanhada à cintura por uma tira de couro. Em baixo, botas-de-dançar-numa-mesa-de-strip. Os olhos subiram. Peitos razoáveis, ombros quase à mostra mas meio tapados pela farta cabeleira loira e ondulada. Frisada? Como se chama ao cabelo meio ondulado como se tivesse saído de uma máquina de enfardar palha? Bem, o que quer que seja. Houve ali uns milésimos de segundo, enquanto fazia todas estas apreciações e observações, em que o meu subconsciente já ia um passo à frente, tentando colocar um bocado de raciocínio no ar. Um passo à frente, identificando a proprietária daquele preparo todo, daquele festival de sensualidade. O subconsciente – o maroto – ficou caladinho que nem um rato, esperando calmamente que o meu consciente me apanhasse a dar com os olhos no rosto da fidalga. Como que à espera para ver o espectáculo. E que lindo espectáculo! Assim que os olhos pousaram no rosto dela, a informação circulou rapidamente até à base de dados do cérebro, identificando-a como a fulana-tal, cujo nome desconhecia, mas cuja dentuça é uma aberração. AAAHHHHHHHH!!!..., guinchei quase a morrer de agonia! Era a gaja dos dentes de hipopótamo! Ah pois é! Que nojo! Imagine-se: uma gaja com ar de boazona, corpo de boazona, loira até mais não, elegante, gingona, mas com uma dentuça a brotar da boca que nem pode usar um copo para beber – tem de ser com palhinha de quarenta centímetros! Perdi logo o apetite para o lanche e para o jantar. Ela não tem culpa, eu sei, mas voltamos à mesma coisa. Uma gaja com aquela armação de dentes que quase chegam ao umbigo, deveria ter um bocadinho de bom senso e não se vestir de forma tão espampanante, nem pintar o cabelo ondulado daquela maneira tão loira. Na melhor das hipóteses, uma saia pelo joelho e pronto! E o umbigo à mostra é para quê?! E como é que ela come sopa? E para que é que ela se ri em público quando isso lhe projecta a dentuça vinte centímetros mais à frente que o normal? Não há uma noçãozinha de harmonia estética? Não há espelhos em casa? Bem, cheguei a casa ainda tão agoniado que corri a escrever essa crónica. Antes, fui procurar na net por alguma aberração semelhante, mas, dada a dificuldade, tive que me sujeitar a forçar qualquer coisa que pudesse, de alguma, forma ilustrar o meu discurso. Apresento, orgulhosamente, três versões de uma loira com dentuça.

Devo dizer, em abono da verdade e da justiça, que a terceira loira, com o cabelo ondulado (ou frisado, ou lá como se chama), tem extraordinárias semelhanças com a loira da dentuça que é a protagonista. Mas, tal e qual! O cabelo é assim, o rosto é assim, e os dentes são tal e qual como esta apresenta. Bom, os dentes são ligeiramente amarelados, para condizer com o cabelo, mas as dimensões são muito realistas, afianço! Isto é, ou não é, de um gajo apanhar um susto de morte cada vez que tira os olhos do umbigo e os choca naquela armação de marfim? É como aqueles gajos que trepam aos postes de alta tenção, com motivações obscuras e pouco inteligentes, e que, de repente, apanham um daqueles esticões que parece uma mistura entre o fogo de artifício na Madeira e as febras a fritar na festa do Avante – um flash que frita a vista e embrulha o estômago! Arre! Oh mulher!, não tens quem te apare o marfim com uma rebarbadora? Nem uma lima para as unhas? pickwick