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Arautos do Estendal

Ela, do alto das suas esbeltas e intrigantes pernas, veio caminhando quintal abaixo até ao estendal, dependurando a toalha onde, minutos antes, tinha limpo as últimas gotas de água. O Arauto viu, porque o Arauto estava lá. E tocou a trombeta.

Ela, do alto das suas esbeltas e intrigantes pernas, veio caminhando quintal abaixo até ao estendal, dependurando a toalha onde, minutos antes, tinha limpo as últimas gotas de água. O Arauto viu, porque o Arauto estava lá. E tocou a trombeta.

Arautos do Estendal

25
Jul12

O dia do Lambrusco

pickwick

Num saltinho, fui ao Pingo Doce comprar cinco garrafinhas de Lambrusco, essa pomada refrescante para aqueles momentos de maior necessidade. De regresso a casa, foi trocar as calças de ganga pelos calções de banho, atascar a mochila com a toalha de praia e as garrafas e a lanterna e os chinelos e mais meia dúzia de tarecos insignificantes. Passar pela garagem, pegar na bicicleta e atravessar a vila com o ar mais descontraído possível, passando despercebido graças ao chapéu-à-malandro e aos óculos-à-mete-nojo.

 

Normalmente, as pessoas andam de bicicleta com um máximo de dois litros de água num daqueles depósitos high-tech incorporados numa mochila muito larilas. Mas, eu, não!, tinha que ir carregado que nem uma mula a caminho do Huascarán...

 

Atravessada a vila, sete quilómetros pelo interior de uma imensidão de pinhais e antigos terrenos agrícolas. Dado o aproximar do meio-dia, tenho que reconhecer que foi uma boa escolha: por um lado, escapando ao trânsito das estradas alcatroadas; por outro, dos sete quilómetros, só uns quinhentos metros é que foram a levar com o sol nos costados, já que o resto foi sempre debaixo de uma muito confortável sombrinha.

 

E este filme todo para quê? Para chegar à piscina da colega que em tempos me apalpou o braço, local escolhido para um ajuntamento de tropas, numa singela aldeia perdida no meio de nenhures.

 

Ou seja, basicamente, um gajo chega, atesta a arca com cinco garrafas de Lambrusco e mais outras três que por lá apareceram, atira-se de mergulho para a piscina, troca duas ou três impressões com o Pedro sobre a dificuldade da vida que é estar ali naquelas condições desumanas, e aparece a anfitriã com umas minis e uma travessa cheia de empadas, pastéis de bacalhau e umas cenas a meio caminho entre um rissol e uma chamuça. Obviamente, um gajo não sai da água. Abeira-se da margem, apoia-se com os cotovelos, e serve-se: mini numa mão, salgadinho da outra. Pumba! E mais um mergulho. E mais uma mini. E mais uns salgadinhos.

 

Entretanto, chegam mais umas colegas, completamente desprevenidas para banhos, o que levantou um coro de protestos. Porque, não é justo ter-se uma piscina, dois gajos e cinco gajas, e três delas não têm equipamento. Não é justo!

 

Lá mais para a frente, houve que sacrificar o prazer e saltar fora, para grelhar uns enchidos e umas carnes, petiscar daqui e de dacolá, esvaziar metade dos Lambruscos, provar os ovinhos de codorniz, o queijinho, e coiso e tal. Uma vida muito difícil, diga-se.

 

Depois do repasto, meteu-se a conversa em dia na frescura da cave, enquanto se provavam uns licores e uns digestivos e ah e tal.

 

E, assim que tocou a sineta do fim da digestão, pumba! para dentro de água outra vez, que, lá para o final da tarde, estava um caldinho para cima de trinta graus. A sorte, é que a anfitriã mantém um frigorífico no recinto da piscina, estrategicamente abastecido de minis, para aquelas eventualidades que… ah e tal…

 

Isto é tudo pormenores insignificantes, eu sei, por isso é que começámos a ficar com a pele engelhada de tanto tempo de molho e tivemos que regressar à mesa para provar os dois quilos de camarão e acabar com o resto dos Lambruscos. Parecia uma tarde nos tempos gloriosos de Roma.

 

Entretanto, lá para as dez da noite, a malta começou a abandonar o barco. Eu esfreguei as mãos de contente por ter ido de bicicleta, o que me permitia beber sem medida, na certeza de que agente algum da autoridade estaria escondido atrás de um pinheiro, na escuridão da mata, à espera de passar um ciclista desprevenido com excesso de coiso no sangue.

 

Tirando este aspecto altamente positivo, sobrava a realidade do regresso, a cavalo da fiel bicicleta. A minha sorte, reconheço, foi ser um moço prevenido e ter levado a lanterna na mochila, porque, se fosse confiar no farol xpto da bicicleta, bem que se podia atravessar um elefante pintado de verde fluorescente no meio do trilho, que eu não dava por nada e espetava-me no meio daquelas pernas elegantes. Assim, foram sete quilómetros aos zigue-zagues, a piscar os olhos, lanterna na mão esquerda e um camarão a saltar até às goelas a cada solavanco naqueles trilhos acidentados. pickwick

22
Jul12

Percalço policial

pickwick

Acabadinho de deixar a capital para trás das costas, já noite dentro, iniciava-se o prazer de circular fora de auto-estradas e “scuts” e coisas a pagantes. Sacudir-me das “scuts”, ultimamente, tem sido um desafio bem sucedido, apesar da paciência necessária para o uso das alternativas, mas, digamos que é uma questão de consciência.

 

À saída de Vila Franca de Xira, numa rotunda generosa, dei de caras com uma invasão de cerca de 850 agentes da PSP, numa “operação stop” nocturna. Ainda me passou pela cabeça fazer-me de distraído e entrar na rotunda a olhar para anteontem, mas, provavelmente, ainda levava dois tiros nas rodas, o que seria uma chatice porque os pneus são relativamente novos.

 

Segui as instruções de um senhor agente, com cara de menos amigos do que eu gostaria, e encostei.


Posto isto, dei conta da conjugação de vários factores:
1 – Tinha quase tudo em ordem: seguro pago, inspecção feita, documentos do carro, carta de condução e cartão de cidadão.
2 – A parte do quase, tinha que ver com os dísticos do seguro e da inspecção exibidos no vidro, que datavam do ano de nossa senhora do assobio, o qual não coincide com o actual.
3 – Estava uma ventania capaz de levantar do chão um vitelo que não tivesse comido a erva diária a que tinha direito.
4 – O motor do vidro eléctrico do meu lado estava avariado, pelo que inutilizado, pelo que tinha que abrir a porta para poder ouvir e ser ouvido.
5 – Os documentos a apresentar, estavam dispersos pelo porta-luvas, à mistura com os equivalentes de anos anteriores, numa daquelas confusões que mais parecia uma mala de senhora.
6 – Levava companhia feminina no banco do pendura, o que é excelente para quando se proporciona a oportunidade de um gajo sair envergonhado por um agente da autoridade.

 

Portanto, entre encontrar os documentos actualizados, juntá-los, abrir a porta, a porta quase voar com o vento, entregar os documentos, estes quase voarem com o vento, a porta quase abater o agente da PSP, o quico do agente da PSP quase voar, e eu ser intimado a sair do carro para o senhor agente poder ter uma conversinha comigo, aquilo tudo pareceu-me um filme.

 

O senhor agente, cheio de paciência, perguntou-me porque raio é que eu andava há tantos meses sem colocar os dísticos no vidro, ao que eu respondi com um sorriso aparvalhado e um “tenho-me esquecido”. O senhor está muito descontraído e muito esquecido… sabe quanto é a multa por não trazer o dístico do seguro? Eu continuei com o mesmo sorriso parvo e disse que não sabia, mas veio-me logo à memória um belo dia na carreira de tiro, quando o sereno tenente Oliveira descobriu que eu me tinha esquecido de dois carregadores de G-3 nos bolsos das calças, oferecendo-me, de imediato, a oportunidade única de rastejar pela imensidão daquela área coberta de calhaus e cartuchos vazios, até que ele se esquecesse que eu existia. Como quem diz: já foste com os cães, pronto. Ou seja, 125 euros de multa só por não trazer o dístico do seguro no vidro! O queixo descaiu-me e o senhor agente atalhou logo: ah, pois é!, não sabia, não é? Comecei a fazer contas de cabeça ao que se podia comprar com 125 euros, além de dar quase para dois depósitos de gasolina.

 

Felizmente, o senhor agente estava numa de pedagogia, o que não lhe ficou nada mal, pelo que sugeriu que eu metesse já de seguida os dísticos todos no sítio e ganhasse juízo. Assim fiz, muito obediente, e segui viagem com o rabinho entre as pernas, safo de arrotar 125 euros mais 60 por não ter o dístico da inspecção.

 

E safei-me de uma vistoria ao porta-bagagens, onde repousava a fiel catana de afiar estacas e desbastar mimosas, porque isso daria um outro filme, com algemas e sei lá mais o quê.

 

Liliana, obrigado por teres encontrado a carta verde do seguro, por teres colocado o dístico da inspecção, por teres estado sempre sorridente e bem disposta, e por não teres pedido boleia ao primeiro camionista que passou.

 

Entretanto, não sei se do episódio policial, se do nível da conversa, quando dei por mim estava quase em Braga, e ainda há pouco tinha saído de Lisboa, quando o destino era mesmo Santarém, para deixar a Liliana. Ora, e o que é que acontece quando se tenta ir de Braga a Santarém por atalhos? Ah, pois é! Uma noite em cheio! pickwick

21
Jul12

Teorias com prostitutas II

pickwick

Estava mesmo, mesmo, mesmo para enfiar à boca a primeira garfada de “carne de porco com cogumelos chineses e bambu”, quando o meu paizinho se lembra de trazer à mesa um episódio televisivo que o impressionou. Valeu o facto de sermos os únicos clientes do restaurante, naquele momento.
O dito episódio, envolveu uma inédita entrevista a uma prostituta sobre as dificuldades e agruras da sua vida profissional, ao que a senhora informou que os clientes mais difíceis são os que a contratam para desabafarem, em vez de satisfazerem as suas necessidades animais.

 

Veio-me logo à imaginação a senhora da vida, alapada no seu banco-lata-de-tinta-20-litros-do-avesso, a olhar para o cliente A, cento e noventa e cinco centímetros e outros tantos quilos, a tresandar a catinga, barba crescida, gadelha desgrenhada, olho de vidro a mirar o infinito, meia dentadura apodrecida e outra metade ausente, unhas enegrecidas sabe-se lá com o quê, espuma de baba a assomar ao canto da boca, a arfar descontroladamente como quem está capaz de tirar a virgindade ao primeiro quadrúpede que se lhe atravesse na frente, seja ovelha ou ouriço-caixeiro, e o cliente B, moço bem-parecido, bem constituído, fato e gravata, perfumado, educadíssimo, desejoso de encontrar alguém que o oiça mais que trinta segundos. E a senhora escolhe o brutamontes, que lhe vai esfrangalhar sardanica e deixá-la com um cheiro imundo para duas semanas. E desdenha o moço, porque não há paciência para servir de bom ouvido.


Posto isto, começa o meu paizinho a teorizar, que ah e tal, a prostituta tem três grandes vantagens em relação a um psicólogo:
1 – Sai incrivelmente mais barato.
2 – O primeiro serviço não pressupõe, nem exige, a marcação de N serviços posteriores.
3 – E há um inegável factor de privacidade, num contraste gritante entre a dispensa do nome, por parte da prostituta, e a recolha de dados pessoais comprometedores, por parte do psicólogo.


Entretanto, imagino-me a parar ali para os lados de Alenquer a caminho de Leiria, a solicitar os serviços da Vanda (nome fictício), a deitar a minha cabeça no colinho dela, qual guerreiro a fazer as pazes com o mundo, e a começar a desabafar as minhas mágoas sentimentais. Ao fim de dois minutos, a Vanda olha-me nos olhos, com um ar ternurento, esboça um sorriso e diz “tadinho”, afagando-me o cabelo. Só que, entre o “ta” e o “di”, vem o balde de água gelada, com uma mão cheia de dentes frontais completamente pretos e ratados, e meio centímetro de borracha de preservativo aromatizado (pêssego e frutos silvestres) entalado entre o incisivo lateral e um canino. Não há condições… pickwick

20
Jul12

Teorias com prostitutas I

pickwick

Mais uma viagem de carro desde a província até à capital. É sempre aquela viagem solitária, aproveitada para meditar sobre “a vida, o amor e as vacas”, observar o tráfego e o casario, enfim. E as prostitutas, de serviço à Nacional 1.


Eu sei que não soa muito bem, mas é verdade que tiro as medidas a todas elas. Entremeio a música do rádio com um repertório pessoal de expressões qualificativas resultantes de apreciações rigorosas e imparciais: uiiiiii…, eia que nojo!, eh lá!, tão gira!, blerk!, tão feiaaa!... e por aí fora. Nesta viagem, em particular, as expressões elogiosas estiveram em crise, em virtude da falta de qualidade dos exemplares avaliados, mas, há viagens em que funciona ao contrário. A par das expressões verbais, aproveito a solidão da viagem para me expressar corporalmente, com toda a liberdade que o banco do lado vazio me permite. Ora assobios, ora esgares de vómito, ora boca aberta e silêncio profundo. É da variedade que nasce a riqueza, já dizia o poeta.


Adiante. Ora, dadas as circunstâncias actuais da minha vida pessoal, veio-me à alembradura uma teoria muito antiga para resolver o buraco da minha vida sentimental. Reza a mesma que poderia parar à beira de uma qualquer jovem prostituta, desde que bem apresentada, ou bem-apessoada, e propor-lhe o abandono daquela vida dura, a troco da partilha do resto da vida dela comigo. Trocar a vida de objecto sexual para ser a única princesa de alguém. Blá, blá, blá. Só um gajo desesperado é que se lembra destas coisas, eu sei, mas já foi há muito tempo, mesmo.

 

E, se bem me lembro, o prazo de validade desta teoria terminou quando fiz a pé a estrada entre Lourosa e Espinho e me cruzei com uma prostituta tão feia, mas tão feia, mas tão tipo-atropelada-por-manada-de-búfalos-em-pânico, que ainda andei uns vinte passos a cambalear, agoniado com a visão, como se tivesse engolido de uma só vez uma perna de javali a decompor-se há duas semanas e invadida por uma colónia de larvas asquerosas a contorcerem-se de mórbido prazer com o nojento banquete.


Era uma teoria engraçada, era. Para uma época em que um gajo não era muito esquisitinho, tinha a fasquia quase a roçar o pó do chão, e havia disponibilidade psicológica para aturar um défice intelectual grave… pickwick

17
Jul12

Leggings para cima

pickwick

Depois de ter aprendido com a Liliana o que são umas leggings, um gajo sente-se logo à vontade para divagar sobre esse adereço modernaço.
Assim que dei os primeiros dez passos dentro do Pingo Doce, esbarrei-me visualmente com uma jovem funcionária de rabo alçado a ajeitar uma pilha de cestos. Era loira e usava leggings.


Ainda eu estava com o cérebro a processar a informação (toma nota, são leggings, são pretas, é loira, são pretas, leggings, ui, pretas, loira, coiso), quando a moça abandona a pilha de cestos a puxar as leggings para cima.


Eu não sabia que as leggings se puxavam para cima. Quem as puxa para cima, é porque, em primeiro lugar, elas deslizaram para baixo. Eu não sabia disso. Liliana, não me ensinaste a coisa toda! Assim, um gajo é apanhado de surpresa, como quem aprende uma receita nova para um bolo, mas não sabe que tem que acender o forno.


Dado o traçado muito positivo da anatomia da moça, perfeitamente visível em meia dúzia de movimentos de antílope, fiquei intrigado. Será que comprou as leggings antes de começar uma dieta rigorosa e agora aquilo escorrega-lhe por entre as nádegas qual faca na manteiga? Será que as nádegas são tão gelatinosas que qualquer movimento reformata o conjunto traseiro a tal ponto que as leggings perdem o norte e caem por si? Será que o material é pouco elástico e o fecho metálico no tornozelo prende de tal forma as leggings às canelas que a cintura descai assim que a moça se dobra para a frente? (sim, reparei no fecho metálico no tornozelo) Será que simplesmente eram umas leggings novas e o gesto resultou de uma preocupação instintiva com o correcto posicionamento do material em relação ao corpo? Não sei, não sei… Mas este desconhecimento atormenta-me a alma… pickwick

 

Actualização - Comentário científico da Liliana: claro que as leggings se puxam para cima, ora essa!, mas normalmente isso acontece quando o número não é o ideal ou se está há muitas horas com elas e com o suor e afins elas deslizam.

05
Jul12

Pirilau AWAC

pickwick

O que é um Pirilau AWAC? Ora bem, para explicar isto, começa-se por uma erudita introdução teórica.

 

A título de exemplo, o E-3 Sentry é uma aeronave da Boeing, que integra um sistema de radar aerotransportado, o qual é mais comummente conhecido pela sigla AWACS (de “Airborne Warning and Control System”). Anda lá por cima, nos ares, e quando detecta alguma coisa interessante começa a fazer pirili, pirili, pirili, e os senhores tripulantes ficam logo todos de pestanas bem abertas para ver o que se passa.

 

Posto isto, eu diria que o pouco discreto instrutor da rapariga da coca é portador de um pirilau equipado com um AWACS. O seu cérebro será uma espécie de Pentágono, a comandar as operações, e a sua língua funciona como o poderoso canhão gatling GAU-8/A Avenger de 30 mm do caça A-10 Thunderbolt II. As mãozinhas, quais F-16, aguardam na pista pela tão desejada ordem.

 

A rapariga da coca, por seu lado, e aparentemente, aposta na tripulação de um Piper PA-34 Seneca forrado com uma película de poliparafenileno tereftalamida, a qual, por sua vez, foi besuntada com vaselina. Ou seja, a película de Kevlar impede a penetração das munições de 30 mm e a vaselina fá-las resvalar para canto como se não fosse nada. A combinação perfeita para uma voltinha no parque sem consequências, mesmo que sob o forte ataque do A-10. pickwick

01
Jul12

Como desenhar uma linha torta

pickwick

Breve manual de instruções para conseguir desenhar uma linha torta numa manhã de domingo:

1. Senta-te numa mesa ampla e prepara-te para trancar a tinta vermelha as quase quarenta provas do exame nacional de matemática que te calharam na rifa, a onze páginas cada uma.

2. Decide intercalar cada prova com uma série de levantamento de pesos, por causa das cócegas.

3. Lá para a oitava prova e outras tantas séries, és apanhado de surpresa pelo agradável ti-ti do telemóvel, sinalizando a recepção de uma SMS.

4. Afinfa o telemóvel com três dedos e sorri, pois é uma SMS da miúda por quem estás completamente pelo beicinho, provavelmente desejando um bom dia a trancar provas.

5. Abre a SMS e descobre que, afinal, não é um desejo de bom dia, mas, antes, um singelo depoimento expressando uma grande vontade que ela sente de te beijar.

6. Toma consciência de que o sorriso parvo com que ficaste não irá desaparecer nos próximos sessenta minutos.

7. Sem pingo de consciência, regressa à oitava prova, convencido de que continuas concentrado.

8. Uma força misteriosa desvia-te a caneta do caminho dos justos e atropela meia equação.

9. Descobre que: a) a força misteriosa, afinal, não foi mais do que uma quase imperceptível pocinha de baba viscosa que te caiu da beiça quando leste a SMS; e que, b) matematicamente, a intersecção de uma linha vermelha com uma poça transparente resulta numa mancha de “nhanha” alaranjada.

10. Qual bombeiro de secretaria, socorre a situação lançando papel higiénico sobre o acidente, para absorver o líquido.

11. Complementa a acção com um golpe genial de tinta correctora branca, como se fosse um spray, e repara como, em alguns microlocais, a brancura apenas diluiu a “nhanha” alaranjada que não tinha secado ainda, transformando-a em “nhanha” salmão-desmaiado.

12. Um rasgo de lucidez atinge-te o cérebro e ocorre-te que não se usam porcarias destas em provas nacionais.

13. Soluciona a questão de forma exemplar, puxando do canivete suíço e raspando o agora naco seco de tinta correctora com algumas tonalidades salmão-desmaiado.

14. Assim que o naco se soltar, levando consigo pouco mais de dois centímetros quadrados de papel de prova e deixando um medonho buraco, expande as tuas mandíbulas num esgar de pânico, enquanto o cérebro se desmultiplica em estratégias de remediação e soluções milagreiras.

15. Ao fim de alguns minutos de intensa actividade cerebral, conclui que no dia seguinte terás que ir desencantar uma prova virgem e nela reproduzir integralmente todo o conteúdo da prova danificada, incluindo os gatafunhos do/a aluno/a, as assinaturas dos professores vigilantes e a parte da equação que ficou colada no naco de tinta correctora.

Nota do editor: a partir do oitavo passo, inclusive, as instruções correspondem a pura ficção e resultam somente da fértil imaginação do autor. pickwick