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Arautos do Estendal

Ela, do alto das suas esbeltas e intrigantes pernas, veio caminhando quintal abaixo até ao estendal, dependurando a toalha onde, minutos antes, tinha limpo as últimas gotas de água. O Arauto viu, porque o Arauto estava lá. E tocou a trombeta.

Ela, do alto das suas esbeltas e intrigantes pernas, veio caminhando quintal abaixo até ao estendal, dependurando a toalha onde, minutos antes, tinha limpo as últimas gotas de água. O Arauto viu, porque o Arauto estava lá. E tocou a trombeta.

Arautos do Estendal

10
Fev07

Ana e o motorista II

pickwick

Bom, com a conversa toda do Euromilhões e do motorista novo e jeitoso, a Ana ia atropelando violentamente uma jovem inocente de cerca de dezoito anos. Segundo a versão da própria Ana. Consta que, segundo relato pormenorizado e dramatizado a rigor, ia um camião do lado direito, perto da passadeira, a Ana não repara que vai o camião nem que há uma passadeira, pimba prego a fundo com a ansiedade de chegar ao lar-doce-lar, e, quando dá por isso, está em cima da passadeira, na qual uma apavorada jovem agita os braços no ar, ali numa fracção de segundo com a morte a cheirar-lhe o chulé dos pés. Ana mete travão a fundo, o carro já é um bom carro, apesar de ser o mesmo, e afocinha mesmo a tempo de não passar a ferro a moçoila em pânico. A colega da Ana, que entretanto viajava no seu próprio carro a poucos metros, ainda lhe vociferou um “és maluca!”, mas parece que a Ana ficou vidrada de todo e nem ligou. O descontrolo emocional apoderou-se da Ana, que quase não conseguiu tirar dali o carro, com tantos tremores e pestanejares de olhos, e eu ainda pensei que ela ia ter ali um ataque durante o próprio relato, tão bem que ela imitou a situação de pânico pessoal desse dia. Chegou a casa, o marido quis saber a que se deveu o filme, blá blá blá. Enfim. No fim do relato, ao qual assistiram várias pessoas, não resisti em gracejar com a fabulosa solução de ela contratar um motorista. Novo e jeitoso, obviamente! E, pasme-se, a Ana voltou a ter aquele nervoso miudinho, aquele arrepiar de espinha de quem ouve falar numa situação imaginária que a levaria ao rubro desde as peles até à ponta dos cabelos. Os lábios mexeram-se naqueles tiques denunciadores. Eu ri-me para ela. Do género, ai tu gostas de levar com ele. Gostas, gostas, sua maluca! Ela olhou-me. Deve ter telepatia! Ai se o meu homem me ouvisse a falar destas coisas! Boca aberta de medo, só de imaginar. Ela finge muito bem. Ai que o meu homem é assim todo direitinho. Aiiii… E aí é que comecei a perceber melhor o filme. Esta mulher vive uma segunda personalidade! É uma maluca, só pensa em gajos novos e jeitosos, tem o pé pesado, guincha por tudo e por nada, deixa transparecer uma personalidade de rigor e seriedade mas, no fundo, é uma maluca. A conversa deu para o MSN, que ontem ela tinha-se ligado no MSN, pela primeira vez. Eu meti-me com ela, ah e tal, foste lá, tão pouco tempo, entrar e sair. Bem, pensava eu que tinha sido por falta de tempo, como ela diz sempre. Mas não. A Ana descaiu-se e contou a verdade. O marido chegou a casa e ela entrou em pânico, não fosse ele apanhá-la nesse antro de depravação e sexo barato que é o MSN e a Internet. Correu para não sei onde, fechou a porta do escritório, foi sacudir o marido para outro lado qualquer, e regressou depois, sorrateiramente, para desligar o MSN e a Internet, não fosse ele desconfiar de qualquer coisinha. Oh Ana… bem, andas-me a sair cá uma maluca… que até fico espantado! Portanto, começou o descalabro daquele casamento. E de quem é a culpa? Das modernices, pois claro. E a Maria? Ah pois é! A Maria também entra na estória. Ainda a conversa ia no motorista, quando a Maria intervém em força, indagando se a Ana também estaria interessada numa motorista. Tipo a própria Maria, que estaria disponível para ganhar um ordenado de motorista de uma euromilionária. Ora bem, eu aí calei-me, mas fiquei cá a pensar para comigo se a Maria estava a tentar transmitir alguma mensagem em ultra sons, ou se não tinha percebido qual era a ideia do motorista novo e jeitoso. Esta gente é toda muito esquisita. Mas a Ana nem lhe respondeu, que devia estar com a mente completamente atravessada com um motorista seminu alapado no banco de trás de um Mercedes. Não é, Ana? Sua maluca, pá! Não tens vergonha? pickwick

09
Fev07

Misógino, misoginia e a mulher mistério

pickwick

Por estes dias, recebi um e-mail muito interessante e simpático, que rezava assim (depois da devida correcção ortográfica):

Olá Pickwick,

Estava a ler blogs "random" e achei o teu. Fiquei a ler o primeiro post sobre os penteados das mulheres. E perguntei-me porque fala tão mal das mulheres?! És misógino?? Não leves a mal esta minha pergunta. Só é que fiquei curiosa. Mas gostei da tua maneira de escrever. Peço já desculpa pelo meu português e pela falta de acentos. Aguardo uma resposta atenciosamente. PV

Querida PV, já me obrigaste a ir descobrir o que raio quer dizer “misógino”. Foi uma estafadeira! E misoginia, também. Uma tímida busca na Internet resultou em:

- que tem aversão às mulheres.

- desprezo ou aversão ao sexo e/ou ao género feminino.

- do grego 'misogynía'

Por favor? Eu?! Oh PV! Mas que conversa é essa? Eu?! Eu, que sou um dos maiores admiradores e fãs do sexo feminino, dos seios firmes, das ancas torneadas, dos cabelos caídos, dos lábios pecaminosos, dos tornozelos com tatuagem, das cuequinhas atrevidas, das pestanas compridas, da pele de seda, das nádegas fibrosas, da voz fina, e de mais uma infinidade de atributos e produtos agregados à condição de mulher, que tanto apraz ao género masculino! Como é possível que confundas, com tanta facilidade, a busca incessante pela qualidade e beleza do sexo e género femininos, com misoginia?! A única aversão que tenho, mesmo, mesmo, mesmo, mesmo, é àqueles defeitos de fabrico, àquelas ultrapassagens de prazos validade sem controlo de qualidade, e àquelas mentes estupidificadas pela condição de gaja pindérica com manias de fineza foleira. Aí, sim, sou um misógino ferrenho e incontrolável. Mas, francamente, se forem a um restaurante e vos sair uma barata escondida numa lula, também não reclamam e apontam o dedo? Pronto, eu faço o mesmo, transformando em baratas as borbulhas mal cuidadas, os pêlos grandes e desprezados, a estupidez crónica, as vestimentas e maquilhagens pindéricas, o volume de celulite exagerado e esquecido, e demais deformações, sendo a lula a mulher perfeita que deveria habitar em todos os exemplares do género e sexo femininos. Está bem? Limito-me a tornar público um processo pessoal de controlo de qualidade. Com boas intenções. Já sei que as gajas não vêem aqui nenhuma boa intenção, mas, a bem dizer, gaja que é gaja vê maldade até numa tampa de sanita esquecida na posição vertical. Quanto a ti, PV, lamento ter descoberto que não pareces ter uma conta no “aifáive”, para grande pena minha. A minha incansável missão levar-me-ia a pesquisar, cientificamente, se a simpatia, simplicidade e delicadeza com que escreveste este e-mail, fazem parelha com uma mulher de atributos ao mesmo nível. Não é todos os dias que uma mulher escreve assim, como tu, com suavidade, porém curiosa e algo magoada, delicadamente, com muita educação, como se estivesses a tocar num baralho de cartas de cristal empilhadas em castelo. Por momentos, quase senti os teus dedos tocarem ao de leve na minha alma, com o indicador a tocar com jeitinho naquela parte do cérebro que comanda o olho atento sobre as mulheres. Quem és tu, PV? Uma mulher misteriosa? De que cor é o teu cabelo? E os teus lábios, são carnudos? Choras na solidão de uma almofada? Andas pelas esquinas, escondida dos olhares? Ou passeias-te pelas passerelles ao fim-de-semana, entre aplausos e bocas abertas de espanto? Onde vives? Partilhas este país de brutos, ou vives nalgum paraíso além-mar? Corres o areal da praia num vestido branco enquanto o sol se põe e o povo já debandou? Escreves poemas sobre sonhos e paixões, que escondes na gaveta da privacidade? Quedas-te a olhar a lua, a tentar encontrar o reflexo de um rosto que se enchesse de sorrisos só por te saber existir? Olhas-te no espelho, sem coragem para rodopiar? PV, quem és tu?, ó mulher misteriosa! Onde andas? Que fazes? Que cantas? Que te move? A que cheiras? Quantas vezes sorris num dia? (suspiro) Bem, não respondes? Pronto! Vou comer um iogurte e não se fala mais nisso! pickwick

08
Fev07

Ana e o motorista

pickwick
A Ana é uma colega minha com quarenta e troca o passo. Muitíssimo bem conservada, olhos azuis (acho eu, que se não forem azuis, é qualquer coisa assim sem ser castanho), cabelo preto, preto, preto e liso, mas em balde. O preto, é pintado, só pode, mas não faz mal. O liso em forma de balde, bom, é um tipo de penteado que inventei agora, numa transição entre o cabelinho daquela actriz portuguesa a preto e branco do cabelo à tigela e a gadelha da Manuela Moura Guedes. Cuida-se fisicamente, no corpo e no vestuário, estando mesmo naquele limite em que o corpo quase não aguenta mais e um dia destes explode para uma quarentona balofa e reboluda, que nenhum homem tem já paciência para aturar. Por falar em homem, a Ana é casadinha, tem uma filhota, e o marido é dono de um restaurante. Eu simpatizo com a Ana, note-se, acho-lhe uma certa graça, especialmente quando cerra a boquita e esbugalha os olhos. Fica muito gira. Também acho graça quando entra em pânico por ter de conduzir para outro destino que não seja o trabalho ou a casa. O “Bora” que o marido lhe ofereceu é uma porcaria de carro, nas palavras dela, mas não deixa de o embalar a 160 na primeira recta que encontra pelo caminho, faça chuva, sol, ou a esteja a estrada ladeada por árvores perfeitas para um encaixe perfeito entre os dois faróis dianteiros. Pronto, é uma gaja. O marido ganha muito dinheiro e ela também não ganha assim muito mal, mas, em comparação, o marido deve ganhar uma fortuna. Uma vez, ia ela para o trabalho, e ao passar numa ponte o carro deu com o rabo na curva à entrada, quase provocando um daqueles acidentes em que as gajas caem ao rio dentro de um carro despistado, como nos filmes. Se ela fosse loira, então era o filme perfeito, especialmente tratando-se do rio Mondego. Bem, quando chegou a casa, ah e tal ia quase tendo um acidente, dizia ela, porcaria de carro. No dia seguinte o marido ofereceu-lhe um carro novo, um Volkswagen Bora. Para juntar a um descapotável qualquer que já lhe tinha oferecido há uns tempos atrás. Agora o Bora também é uma porcaria. Sim, Ana, pois é. Bem, conversa puxa conversa, vai daí ao Euromilhões, ah e tal, que a Ana já devia ser a quinquagésima vez que comentava “se eu ganhasse o Euromilhões…”, e diz ela, desta vez: detesto conduzir, se ganhasse o Euromilhões, não deixava de trabalhar, porque gosto muito de trabalhar, mas arranjava um motorista para me trazer todos os dias. Pausa. Assim um motorista novo e jeitoso, rematou. Pausa escandalosa na mesa. Aposto que todos pensámos o mesmo: olha m’esta, casada e mãe de filhos, com idade para ter juízo, a querer um motorista novo e jeitoso… A Nanda, que é quarentona em fim de linha, solteirona e tia compulsiva (tia do tipo irmã de um dos pais das crianças), não se conteve: para que queres um motorista novo e jeitoso, se só o vês de costas? Nova pausa. Para meditação profunda. A Ana, com aquele jeito que só ela tem, saltitava com os lábios entre a posição de sorrisinho perverso e posição do ar sério e severo e puritano. Com mais incidência para a primeira posição. Portanto, traduzindo-lhe o pensamento, saía mais cedo, parava num pinhal, pimba no motorista, motorista pimba nela, voltam à estrada, manhã de trabalho, motorista vem buscá-la para almoço, pimba e pimba, tarde de trabalho, motorista regressa, pinhal, pimba, estrada, casa, e pronto. Parece um bom programa para uma ganhadora do Euromilhões. Ficou no ar: e o marido, não anda a dar conta do recado? Afinal, a rapariga ainda tem muito para dar, com aquele cabelinho pretinho, aqueles olhos clarinhos, aquela roupinha sempre a cair bem, as botinhas, os lábios fechadinhos como que a pedir, o sorrisinho a tremer no canto dos lábios como que a tentar fazer transparecer uma timidez feminina inexistente mas muito provocante, as costas direitas, a postura firme, os abanões pelo corpo todo, sei lá. Já agora, porque é que as mulheres se abanam? Será uma tentativa para chamar atenção para os volumes carnais em movimento, hei estamos aqui e somos abundantes e suculentos? Isto e outras coisas davam um livro. Davam, davam. pickwick
05
Fev07

Cabelos e penteados

pickwick

Na semana passada, a Maria apareceu com um novo penteado. Não resisti a olhá-la várias vezes pelo canto do olho. Meu Deus, agora é que ela ficou mesmo intragável, pensei eu. Passados alguns dias, foi a vez da Paula, com um novo penteado. Hoje, foi a Carla. Mas estas gajas estão todas parvas ou quê? Será que ainda não repararam que, quando regressam do cabeleireiro, vêm mais feias do que quando entraram? Ou será que a mulher tem em si uma deformação da capacidade de apreciar a beleza, que actua no momento em que se lembra de ir ao cabeleireiro? Vamos ser honestos! Quando uma gaja sai do cabeleireiro com um novo penteado, só em raríssimas excepções vem com um ar mais bonito e apetitoso. Regra geral, tal como aconteceu com a Maria, com a Paula e com a Carla, vêm com umas porcarias e uns rebicoques, umas lacas de acender fogueiras, umas franjas à espanador-do-pó, uns ondulados piores que os das batatas fritas da Matutano, e mais um monte de pormenores que não consigo atingir. É pá, pronto, vêm foleiras! Não compreendo, a sério. Depois queixam-se que os gajos não comentam o novo penteado. Pois claro que não comentam, ora essa. O único comentário honesto seria muito mal recebido, por isso, mas vale ficarem calados. Ainda gostava de saber como é que aquilo funciona, lá no cabeleireiro. Tenho algumas lembranças nubladas de quando era puto e tinha de ir atrás da minha mãe para o cabeleireiro, em plena década de 70, com aqueles capacetes lunares, os rolinhos, os lavatórios, as conversas da treta, as revistas, a água quente, o pivete, etc. Tudo recordações desnecessárias. Hoje ainda é capaz de ser assim. A gaja chega, o(a) cabeleireiro(a) ah e tal, hoje ficava-lhe bem um penteado X13. E a gaja, ah sim?, e um P26? Esse só se for com um cheirinho de loiro a fugir atrás da nuca. Ah, então está bem. Vem uma foto de um catálogo de penteados, ah e tal, que giro!, gosto mesmo é daquele ali, então está bem. E pronto, o(a) artista, que não percebe muito do assunto mas dá ares de muito domínio, pega na tesoura e zás! Zás, zás, zás, flosh, flosh, zás, baf, baf, zás, flosh, fssst, fssst, espelho para a esquerda, espelho para a direita, fssst, flosh, e aqui vai disto. Mas as gajas não têm noção que na esmagadora maioria das vezes saem do cabeleireiro com um ar horrível, piroso e plastificado? Como se tivessem comprado uma peruca estragada no meio da Feira da Ladra. Não notam? E quando se casam? Ou vão a casamentos? C’um caraças! Aí é que a coisa atinge limites básicos de estética, saltando facilmente do feio para o grotesco. Uma noiva em dia de casamento, com jeitinho, consegue espremer o cabelo para uma frigideira e fritar meia dúzia de salsichas e estrelar quatro ovos, tudo com sabor a canela e com estrelinhas de brilhantes a boiar. E as amigas dos noivos vão pelo mesmo caminho, cada qual com o pior vestido que se possa imaginar, e com os penteados mais foleiros de que alguém se conseguiu lembrar. Mas, ninguém nota? Anda tudo cego? As minhas colegas, por exemplo, agora estão todas com um ar de mete nojo que nem a um trolha sexagenário e desdentado conseguiam arrancar um assobio. Daqui por umas duas ou três semanas, aquelas parvoeiras todas já passaram, os cabelos já assentaram, a laca nojenta já desapareceu com as lavagens, e os efeitos especiais e psicadélicos deram lugar à naturalidade e beleza dos cabelos femininos. Até lá, tenho que gramar diariamente com aquelas obras de arte contemporâneas, feitas por artistas de meia-tigela e pagas a ouro. As outras colegas reparam, olham, comentam, ah e tal, tão giro!, e em menos de nada vou ter as minhas colegas todas armadas aos efeitos capilares, madeixas às cores, cabelos às ondas e nacos de laca seca pendurados. Vai chegar um dia em que o ambiente ficará insuportável. Não haverá uma única gaja para quem se possa olhar sem ficar logo com o estômago embrulhado. Eu só não sei é como é que elas não percebem que ficam foleiras com os novos penteados. A sério! Não percebo! Não usam espelho em casa? Tudo bem que isto é como em tudo: há gostos e gostos! É como fazer um tuning na carroça lá em casa. Há quem goste, mas, aos olhos de uma pessoa normal, um tuning na carroça fica sempre com aquele ar de Quim-Barreiros-enrolado-com-a-Monserrat-Caballé. E as gajas que saem do cabeleireiro, com um tuning na gadelha, ficam com o mesmo ar: espalhafatoso, mas muito piroso! pickwick