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Arautos do Estendal

Ela, do alto das suas esbeltas e intrigantes pernas, veio caminhando quintal abaixo até ao estendal, dependurando a toalha onde, minutos antes, tinha limpo as últimas gotas de água. O Arauto viu, porque o Arauto estava lá. E tocou a trombeta.

Ela, do alto das suas esbeltas e intrigantes pernas, veio caminhando quintal abaixo até ao estendal, dependurando a toalha onde, minutos antes, tinha limpo as últimas gotas de água. O Arauto viu, porque o Arauto estava lá. E tocou a trombeta.

Arautos do Estendal

04
Set12

Engarrafamento na ponte

pickwick

Há dias em que um gajo não está para aturar ninguém, nem sequer a solidão da própria casa. Aí, passa uma ventania debaixo das ventas (como o próprio nome indica, é a zona do corpo pode onde costumam passar as ventanias) e é sair por aí, à descoberta de coisas novas, quiçá na esperança de que aconteça alguma coisa que quebre a monotonia.

 

Sábado foi assim. Mochila às costas, frasquinhos de recolha de sementes, máquina fotográfica, chapéu à mete-nojo, calções de banho e botas. Rumo à Serra da Estrela.

 

Pouco acima da Mata do Desterro (Seia), há uma levada de água que alimenta a Central Hidroeléctrica da Senhora do Desterro. A acompanhar a levada, durante longos metros, existe uma linha de arbustos cujo nome desconheço, mas que sempre me irritaram por não terem sementes. De vez em quando, no silêncio da solidão, chamo-lhes nomes feios, porque são muitos e não têm sementes. Mas, neste sábado, descobri um deles carregadinho de sementes! No meio daquilo tudo, um único é que tinha sementes. Em poucos segundos, já andava a saltitar de frasquinho na mão, apanha daqui, apanha dali, qual elefante sorridente a saltitar de nenúfar em nenúfar, aproveitando o feliz momento para dialogar com a planta produtora, nomeadamente para lhe chamar mais nomes feios, porque já podia ter feito sinais de luzes há muitos anos, para eu saber que era a única que tal. A vantagem de se andar a apanhar sementes em locais desterrados, é que se pode dar ao luxo de falar abertamente com as plantas, o sol, o vento e a água, sem que se incorra no risco de ser olhado de lado por cidadãos desprevenidos que passem por perto.

 

Mais ao lado, percebi porque a aldeia mais alta de Portugal tem no nome que tem. Aquilo tresanda a sabugueiros (sambucus nigra)! E eu que costumava apanhar umas poucas bagas de sabugueiro quando fazia a corridinha pelos pinhais… quando ali, dava para encher a bagageira do carro só com bagas de sabugueiro, tal era a abundância. E ao lado, uns belos exemplares de amieiro-negro, cujas bagas deixam as mãos num estado inoperacional para massajar um qualquer delicioso corpo feminino. Não havia corpo feminino, mas não faz mal, não custa nada sonhar.

 

Curva à esquerda, curva à direita e estacionei o carro na povoação de Cabeça, como quem vai de Loriga para Vide. No ano passado andei a vadiar na povoação de Casal do Rei, mais abaixo, mas noutro dia encontrei na Internet umas referências positivas à flora ribeirinha de Cabeça, daí o interesse na pesquisa no terreno.

 

O passeio começou bem. Um senhor que abatia pinheiros, informou-me que se chegava à ribeira “por ali abaixo junto aos pinhos”. Eu fui mais ou menos por ali abaixo, que pinhos havia por todo o lado, mas talvez me tenha desviado um pouco para a esquerda, para montante. Ou seja, na falta de melhor, foi mesmo mato fora, a descer um barranco de cascalho (xisto) solto, em plano bem inclinado, com jeitinho para não deslizar depressa demais e acabar com as nádegas num qualquer penedo no meio da ribeira.

 

Nas margens da Ribeira de Loriga, encontrei azereiros com uns bons sete metros de altura. Uns verdadeiros monumentos! Carregadinhos de bagas… ainda não maduras. Peixinhos a dar às barbatanas para um lado e para o outro. Uma maravilha. Saltitando de penedo em penedo, por entre o caudal da ribeira. Entretanto, a coisa começou a ficar um bocadinho feia, com pouco espaço de manobra para saltinhos bem sucedidos, e subi para um pequeno trilho que acompanhava a ribeira, alguns metros acima. Já estava satisfeito com o que tinha avistado e só teria que regressar daqui a um mês, para apanhar as bagas maduras.

 

Um pouco mais à frente, havia uma ponte para atravessar a ribeira para o lado da povoação, onde tinha deixado o carro. Só que, para meu espanto, havia engarrafamento na ponte. Congestionada, vá. Três toalhas ocupavam toda a largura do tabuleiro, sem deixar espacinho para uma ágil botinha. Três toalhas, às quais correspondiam três biquínis a travarem a queimadura do sol nas partes mais íntimas de outras três amostras do sexo feminino.

 

Não podia ser um rebanho de cabras guardado por um cão serra da estrela de coleira de picos contra lobos? Podia, mas não cheirava tão bem como três corpos femininos a bronzearem-se na pacatez de uma ponte pedonal afastada do rebuliço da agitada povoação de Cabeça.

 

E um gajo pensa: vou ali, atropelo as meninas e caio para cima de uma delas feito distraído?

 

Não, não vais. Portas-te bem, segues o trilho adiante, passas ao lado da ponte, fazes de conta que não há biquínis, e depois logo se vê como hás-de chegar ao carro. E assim foi, mato fora, mais uns monumentais azereiros, castanheiros centenários, currais de xisto, socalcos do tempo da outra senhora, e um azevinho com uns bons dez metros de altura, até encontrar outra ponte, já quase na China. pickwick

3 comentários

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    pickwick 05.09.2012

    Eu sei, eu sei... vou penitenciar-me por isso, mas confesso que não resisti à tentação de provocar o pecado da inveja em leitoras desprevenidas... hahahaha :p
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    cocacolagirl 06.09.2012

    Não estava mesmo a contar com estas fotos...vou começar a fazer também isso, só para tu veres como custa :p
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