Porcarias in a bottle
Ontem fui jantar a casa de uma amiga. Eu até gosto de ir jantar a casa de amigas, excepto quando me obrigam a encher o bandulho até ficar com a sobremesa a boiar no quimo (hoje aprendi uma palavra nova) à altura dos lóbulos das orelhas. Foi o caso. Arrastei-me, feito elefante-sem-pernas, até ao sofá da sala, estiquei-me e liguei a televisão. Já não via televisão há vários meses, pelo que havia necessidade de me actualizar. Descobri, após breves cálculos matemáticos de algibeira (algoritmo secreto, portanto, não mo peçam), que cerca de 7% da população portuguesa faz parte de elencos de telenovelas. Só pode! São centenas de telenovelas portuguesas, com centenas de actores cada uma, e nós somos uma nação com pouco mais de dez milhões de almas. Portanto, 7% e não se fala mais nisso. Nos intervalos, claro, a bela da publicidade. Como só oiço rádio, também havia que fazer uma actualização da publicidade da moda. E, aí, fui despertado para o exagero a que chegaram as cervejas portuguesas. Daqui a nada, não haverá cervejas, nem cervejolas e muito menos bejecas. Só porcarias! Limas, porcarias, groselhas, porcarias, lights, porcarias, zeros, porcarias, sem álcool, porcarias, ruivas, porcarias, pretas, porcarias, greens, porcarias, perfeitas, porcarias, não sei quê, porcarias. Não bastassem as porcarias que fazem à pobre da cerveja, ainda se lembraram de mais uma parolice para as vender: uma “mini design edition”! Mas o que raio é uma “mini design edition”? Design? Mas isto é alguma campanha para vender cervejas àqueles gajos do circo que engolem vidro partido? Ou a gays com preocupações ergonómicas? Qualquer dia, fazem uma “big pirilau edition”, para tornar alcoólicas as mulheres com défice de libertação de endorfinas. Chiça! Qualquer dia… bem… qualquer dia… inventam uma porcaria para meter nos animais, logo na criação, ou ainda no feto, para nascerem já com sabores e mutações. E os talhos nunca mais serão os mesmos! Coelhos sabor a morango. Peru pineapple. Pato sabor a maçã-javali. Picanha sabor a bola-de-bacalhau-de-Lamego. Frango lima light. Entremeada zero%. Novilho green. Mais tarde, nascerá o amendoim-bacalhau-à-brás, a alface-presunto e o pêssego-requeijão. Mas, qualquer dia… qualquer dia… o ser humano já nasce - ele mesmo - com aroma. Imagine-se! Quando trincamos a chicha deliciosa do braço da namorada, liberta-se um aroma a damasco. Não serão precisos desodorizantes, porque o corpo libertará automaticamente suor aromatizado (arroz de marisco era uma opção interessante). Nos ginásios, a mistura de odores no ar pareceria o Mercado ao sábado de manhã. Sovacos a cheirarem naturalmente a floresta ou selva tropical. O suor, nalguns casos, poderia ser usado como tempero para carnes grelhadas (suor com aroma a vinho branco). E os odores sexuais? Ui! De abrir o apetite! Imagine-se, um garanhão de metro e oitenta que, no momento de se vir, libertaria um discreto odor a paté-de-atum ou a camarão-com-melão. Do melhor! E bufas? As bufas – aqueles gases mortíferos libertados inferiormente em momentos de intimidade e alívio – revolucionariam o saber estar do povo e as regras de etiqueta. A Paula Bobone escreveria best-sellers sobre a arte social de libertar bufas com estilo. Bufas com cheiro a laranja, bufas com cheiro a rosas, bufas com cheiro a água-com-gás (não subestimem a mente humana), bufas em molho de escabeche, e, no topo da arte, la pièce de résistance, o aproveitamento da capacidade inflamatória das bufas para fazer grelhados e fondues, dispensando a parte chata dos temperos. E incompatibilidades? Ah e tal, o senhor nasceu com aroma a melancia, portanto não pode nadar