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Arautos do Estendal

Ela, do alto das suas esbeltas e intrigantes pernas, veio caminhando quintal abaixo até ao estendal, dependurando a toalha onde, minutos antes, tinha limpo as últimas gotas de água. O Arauto viu, porque o Arauto estava lá. E tocou a trombeta.

Ela, do alto das suas esbeltas e intrigantes pernas, veio caminhando quintal abaixo até ao estendal, dependurando a toalha onde, minutos antes, tinha limpo as últimas gotas de água. O Arauto viu, porque o Arauto estava lá. E tocou a trombeta.

Arautos do Estendal

27
Jun12

Intimidações

pickwick

Desde há vários e longos meses que travo uma discussão filosófica muito acesa com a Liliana, a propósito do jejum a que o destino a parece ter forçado.


(contextualização: a Liliana tem 24 aninhos (já?!), a acabar a sua licenciatura, moça inteligente, sabe o que quer, muito bem apresentada, faz duas horas de ginásio dia-sim-dia-não e o resultado até faz impressão à vista desarmada)


A discussão gira, portanto, em torno do facto de a Liliana estar de jejum, apesar daquela tão boa apresentação. As amigas, pelos vistos, abarbatam-se todas com os respectivos namorados, embora fiquem a anos-luz dela no que respeita a boa apresentação. Mais, parece que, quanto pior o feitio delas, mais fácil é encontrarem um namorado.


Para contrapor as teorias delas sobre o destino e a má sorte, eu insisto em duas teorias principais que se lhe aplicam na perfeição: a teoria das probabilidades e a teoria da intimidação.


A teoria das probabilidades, é simples de perceber. Quanto maior o número de rapazes que ela conhecer, na sua vida pessoal, profissional ou lúdica, maior a probabilidade de encontrar um rapaz que lhe caia aos pés com uma rosa entalada nas beiças. E como está a haver, claramente, uma assímptota horizontal na função que descreve o número de rapazes que ela conhece, as coisas correm mal. É como ir à caça de coelhos com uma G-3, lado a lado com uma mão-cheia de caçadores com os seus coelhos à cintura, num terreno já batido e onde apenas sobram esquilos, ratos-do-campo, gafanhotos e uma menina de mini-saia de serviço ao quilómetro trinta e nove.


A teoria da intimidação já é uma coisa mais refinada. Dita esta teoria que há um certo número de pessoas, independentemente do sexo/género, que têm um perfil intimidante. Ainda que possa tresandar a simpatia, um perfil intimidante é algo natural, quase inexplicável, mas facilmente detectável, que coloca uma barreira cerrada dissuasora de qualquer niquinho de atrevimento. A um homem, nunca passará pela cabeça dar uma palmadinha nas nádegas a uma mulher com perfil intimidante, ou apalpar-lhe uma maminha a ver se faz “fon-fon”. Ora, sendo dissuasor de atrevimentos, este tipo de perfil será, também, dissuasor de desejos. Ou seja, em vez sugerir um jantar romântico, ou um passeio à beira-mar, ou um cineminha, ou uma canja com broa à luz da vela, o homem desanima e parte em busca de paisagens mais pacíficas, em que não corra o risco (ainda que infundado) de ter que engolir um sofá ou um fardo de palha a arder. E, dado o facilitismo e o imediatismo que se entranharam na cultura da nossa sociedade, para quê arriscar, quando ao lado há garantido e sem esforço? pickwick

19
Jun12

A cor do primeiro encontro

pickwick

Ao fim de longos meses de espera, de anseio, de lábios mordidos, de talvezes, de qualquer-dias, a Liliana viu-se a braços com o facto de ter três dias para escolher a roupa para o seu primeiro encontro com o Mateus. Naturalmente, recorreu ao meu aconselhamento técnico, dadas as minhas excepcionais capacidades para debitar baboseiras sobre vestuário feminino.

 

A primeira coisa que me veio ao pensamento, foi o meu primeiro encontro com uma mocinha, lá para o ano de 1985. Era uma rapariga engraçadinha, que me enchia as medidas, com uns lábios imprevisivelmente carnudos naquelas feições orientais. Uma mulher, é sempre uma mulher, seja chinesa, como ela, ou nem por isso, com as mesmas expectativas, preocupações e anseios. Acontece que a rapariga deve ter procurado aconselhamento técnico para aquele primeiro encontro. E tal foi a intensidade do aconselhamento, que eu quase não a reconhecida, tal era a transformação. O longo cabelo negro, que eu tanto desejava afagar e sentir, estava todinho apanhado no cimo da nuca, num enrodilhado artístico que mais parecia um cocó de São Bernardo. Desilusão completa! Semanas a fio, a imaginar-me pendurado nos fios do cabelo dela, qual Tarzan romântico, deitadas pela sanita abaixo com aquela amarração escusada. O corpinho, que eu venerava, e que conhecia ora debaixo de um uniforme escolar branco e imaculado, ora debaixo de um vestuário sóbrio, estava escondido debaixo de um exercício de alfaiate muito mal conseguido. Um vestido armado ao chiquérrimo, a atirar para o balão, que tira a qualquer homem a vontade de abraçar a cintura feminina. Uma desgraça. Para completar, uma mistura impressionante de bodegas a cobrir-lhe o rosto, que hoje compreendo, mas que na altura me deu a volta ao estômago. Para mim, que aprecio a sobriedade e a naturalidade, foi uma tacada de basebol no queixo. A coisa começou logo a correr mal, muito mal, e terminou pessimamente. Nunca mais ela falou comigo, nem eu com ela, e muitas pragas me deve ter rogado. Eventualmente, poderá ter ido para freira, à semelhança da… coiso… bom… adiante…

 

Portanto, tentei orientar o meu aconselhamento técnico no sentido do desaconselhamento. Isto é, nestas coisas, mais vale uma mulher ficar “quieta”, do que meter-se com invenções e acabar num estado desagradável à vista. Apesar disso, a Liliana insistiu em ir de vestidinho. Tem corpinho para isso, obra das longas horas quase diárias que tem passado no ginásio desde há muitos meses. Só faltava escolher a cor. Preto, vermelho, branco e preto, salmão.

 

Branco e preto, não, porque baralha. Não se pode deixar um homem baralhado, quando o objectivo é não o deixar fugir. É uma espécie de gelado “Perna de Pau”: não se sabe se começar pelo chocolate, pelo branco, ou pelo vermelho, ou mudar para uma sandes de presunto.

 

Vermelho, também não. Fere a vista e atinge o cérebro masculino, podendo provocar lesões atitudinais indesejáveis. Parece um fogo que não queima, como uma roseira que não pica, pelo que o homem, seja bombeiro, pirómano, ou maricas, não terá receio algum em se atirar de cabeça para as chamas.

 

Salmão, só a partir do segundo encontro. Salmão transmite uma ideia de fragilidade. Um homem a olhar para uma mulher vestida cor de salmão, é como um urso no Alasca a olhar para as águas baixas de um ribeiro, onde um salmão de aspecto delicioso aguarda pacientemente pelo seu fim, entalado entre dois calhaus.

 

Preto, é que é. Primeiro, ninguém desconfia. Depois, impõe respeito. Não baralha. E tem a vantagem de concentrar o olhar masculino, que fica hipnotizado como que à procura do fundo num buraco negro. E, como diria o poeta, homem concentrado, é homem garantido.

 

E nem penses em levar aquela mini-saia rodada e arejada! Senão, acabas o encontro romântico no hospital, com o pobre Mateus em estado grave de encravanço cardíaco, de língua de fora, espasmos na perna esquerda, olhos revirados, súbito crescimento capilar, e um prolongado uivo disfarçado de suspiro… pickwick

16
Jun12

Personal trainer 1

pickwick

Conforme prometido há três anos atrás, ofereci os meus préstimos técnicos (cof cof cof) para preparar fisicamente a Virgulina (nome de código… e ainda bem!) para concorrer à Academia Militar. Está na hora, agora que terminou o 12º ano. E, na sequência disto, encontrámo-nos outro dia no campo de jogos, para trocarmos impressões e combinar estratégias.

 

Lembrava-me de ver sempre a Virgulina a “papar” as provas de corta-mato, muito leve e muito fresca, a “dar ao pedal” por ali fora, acima e abaixo, ora no asfalto, ora em terra batida. É sempre agradável ver uma miúda com genica, por comparação extrema com umas quantas que parece que levam uma betoneira incrustada nas nádegas. 

 

Mas, como em tudo na vida, não há nada como um engano técnico para um gajo se remeter à humilde posição de singelo mortal. Tantas provas de corta-mato ganhas, afinal, não são suficientes para garantir a capacidade física para executar uns quantos exercícios banais.

 

Descobri, então, que a Virgulina não consegue ultrapassar as provas de salto em extensão, salto da vala e flexão de braços na barra. Já conseguiu, até, espetar-se numa vala, quando foi ao quartel de infantaria experimentar a coisa. Só não saiu de lá toda “feita num oito”, porque não calhou. Basicamente, falta-lhe potência muscular, tanto nas pernas, como nos braços / costas. Um desafio pela frente, portanto, no prazo de uns míseros dois meses.

 

Numa dimensão paralela (estritamente), imaginei-me a treiná-la num barracão fedorento, a levantar fardos de palha e baldes de estrume, a empurrar vacas teimosas, a sacudir-se dos irritantes enxames de moscas, a içar-se numa corda untada com banha de porco, a comer meia dúzia de ovos ao pequeno-almoço e dois mega-bifes de veado a cada uma das restantes refeições, ela a gemer de dor (coitada) e eu a dar-lhe com o cabo do ancinho nas pernas e a gritar-lhe “anda lá, pá! xiu! faz-te um homem!”. Sim, são muitos filmes do Balboa, pronto…

 

De regresso a esta dimensão, deixei-lhe umas quantas sugestões de treino. Mas, fiquei com aquela impressão estranha de que vou ter que voltar à carga, de forma mais intensa, quiçá violenta, até porque a prova de flexão de braços na barra deixou-me ligeiramente preocupado. Pelo que percebi, até ao ano passado, a prova de flexão de braços na barra era feita apenas pelos rapazes, sendo que as meninas faziam, em alternativa, flexões de braços no chão, que é muito mais fácil. Subiram a fasquia para as meninas. Assim seja. Daqui por umas semanas, a Virgulina terá que estar apta a erguer uma caneca de litro de cerveja só com o mindinho e o polegar, terminando a beberagem com um mui másculo e harmonioso arroto… ou não! pickwick

10
Jun12

Mirador de gajedo

pickwick

Há gente que, por meia palha, faz julgamentos sumários de personalidade. Apelida fulano e sicrano, bate palmas, pega fogo às barbatanas, aponta o dedinho, enfim. Tem dias em que eu também sou assim e não perdoo.

 

Ora, estava eu distraidíssimo a divagar sobre coisas importantes da vida, quando uma leitora deste blog traçou implacavelmente o meu suposto perfil: “mirador de gajedo”. Podia ter-se lembrado de outra coisa, eventualmente mais bonita? Podia, claro que podia, mas deu-lhe para isto. Curiosamente, não encontrei argumentos imediatos para refutar tal traçado, mas isso agora não interessa.

 

No dia seguinte, calhou ir almoçar com colegas de trabalho. Quando dei por mim, estava sentado à mesa com seis mulheres. Em princípio, é agradável almoçar numa mesa só com mulheres.

 

À minha frente, a colega que me apalpou obscenamente o braço num dia de chuva. À minha direita, a colega que o mais majestoso par de coiso-e-tal que deambula lá pelo local de trabalho, sendo que o dito par sobressai predominantemente entre a Primavera e o início do Outono, devido às temperaturas mais amenas que incentivam à condução de camisas descapotadas. Em frente a esta, uma colega com dentadura estilo “Aliens, o oitavo passageiro”, mas que compensa pela sua boa disposição e disponibilidade. Ao lado da colega do majestoso par, uma de par inferior, da qual não há muito a dizer, excepto que o pai quase que se afoga em dinheiro. Na extremidade da mesa, a eguazita saltitona com cérebro de ervilha e uma colega discreta sobre quem jamais teria assunto para escrever.

 

À distância de uma jogada do Cavalo no xadrez, estava uma colega que veio almoçar connosco para matar saudades. Já escrevi sobre ela várias vezes, porque aquela elegância toda combina muitíssimo bem com a respectiva dimensão peitoral. Mas, neste dia, a minha impressão sobre ela tomou uma nova perspectiva. O cabelo liso, pintado de carmim, caía pelo crânio abaixo, apenas se desviando para deixar passar duas orelhas-de-abano. Acima dos lábios pintados, dois olhinhos de carneiro-mal-morto. Tive um flash e juro que vi nela Neytiri, a personagem feminina saída-da-casca de “Avatar”, numa versão atacada de palidez súbita. Só lhe faltava a pele azul e a cauda sexy a mergulhar na sopa para aferir a temperatura. Entretanto, aproveitei a minha camuflagem natural para verificar se os restantes adereços eram compatíveis com a Neytiri e dei de caras com um decote exótico e improvável: o extraordinário decote-de-alguidar!

 

O termo “decote-de-alguidar” surgiu-me naturalmente. Por comparação: imagine-se um alguidar cortado ao meio (na vertical) e colado a uma parede de onde brotam duas maminhas que parecem ficar a nadar no vazio dentro de um meio-alguidar tão grande. Ou seja, houve ali um claro lapso na escolha do tamanho do sutiã… ou… é algo que estará a entrar na moda e eu tive a honra de ver um dos primeiros exemplares. Seja como for, não fica bem. Não fica bem, porque alguém pode começar a atirar azeitonas ou ervilhas lá para dentro. Não fica bem, porque o empregado pode descuidar-se, confundir o prato da sopa com o decote e provocar uma queimadura. E não fica bem, porque, de onde eu estava sentado, garanto que conseguia encestar uma bola com, pelo menos, 18 cm de diâmetro! pickwick